‘Queremos uma identidade para a arbitragem’, diz chefe do apito na CBF

O Brasileirão-2017 terá novidades na arbitragem. Mais especificamente na forma com a qual os árbitros são avaliados. A menina dos olhos é um software de análise de desempenho, que vai delinear de forma científica, na visão da comissão de arbitragem, a performance dos árbitros. Na visão do Coronel Marinho, chefe do apito nacional, a ferramenta servirá para melhorar os critérios, criando uma identidade para a arbitragem brasileira. É sobre os efeitos desse lançamento para as Séries A e B que ele fala nesta entrevista.

Como será o funcionamento do programa de análise e o trabalho dos analistas?
Eles sincronizam o que está aqui com a imagem. Tem cartão mal aplicado, falta, técnica de arbitragem que chama atenção. Às vezes o cara não se movimenta bem, não está cobrindo uma diagonal, o assistente está fora da linha do último defensor… Nossos analistas vão ver o lance e passar para o árbitro, com imagens, o que ele precisa aprimorar. Paralelamente, os analistas fazem um relatório. Chamamos de radar, uma nova ferramenta, com um novo protocolo. Antigamente, escreviam alguma coisa, colocavam uma nota, e era jogado de lado. A nota agora não será dada por ninguém. O sistema vai dar. Fizemos uma calibragem, uma mensuração, os pesos que podem interferir. Fizemos estudo e vamos colocar no sistema. O que eu quero do meu analista é que ele coloque as informações. São itens que me interessam.

Então vai dar para controlar melhor desempenho dos árbitros na sua visão?
Assim, vai ser criado um banco de dados em relação a esse árbitro e vamos ver se ele está progredindo ou não. Teremos dados estatísticos e informação científica de tudo. Vamos ter uma identificação dos problemas da arbitragem brasileira, no que ela falha, o que precisamos ajustar. Hoje eu não tenho assim. Será um trabalho muito mais científico. Vamos sair do subjetivismo, com notas irreais. Às vezes pego dois relatórios e pego notas e comentários discrepantes. Nas Séries A e B, vou ter dois analistas. Um em campo e outro pela TV.

Como vai ficar a questão das notas para os árbitros?
O sistema vai gerar pontuação individuais e por equipe. Cada árbitro terá sua nota e outra da equipe. Eu não posso alterar nada. E se achar análise discrepantes, temos o minuto a minuto, com todas as faltas, lances… O registro das irregularidades vai gerar a pontuação. No fim do ano, o sistema vai mostrar quais itens o árbitro não avançou. Vai ter meta para atingir. Se não conseguir, vai cair ou até sair do quadro. Queremos os melhores árbitros do país.

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Assim é o sistema que os analistas vão utilizar (Foto: Igor Siqueira)

E como isso vai impactar no sorteio?
No sorteio, como vamos ter os relatórios, os que estiverem melhores vão fazer os jogos mais importantes. Hoje, eu tenho 50 árbitros que vão atuar nas Séries A e B, com 70 assistentes. Na Série A, vamos formar equipe fechada de seis pessoas, vão ser sempre os mesmos juntos. Árbitro, assistentes 1 e 2, quarto árbitro e dois adicionais. O quarto árbitro agora vai passar a ser um assistente de função mesmo. Se tiver um problema com o assistente, ele entra. Se o árbitro principal tiver problema, entra o adicional 1, que estará no mesmo nível do que estará apitando. Vamos começar isso na Série A.

Como esse resultado vai chegar aos árbitros?
O principal problema da arbitragem brasileira hoje é a falta de critério. Cada um tem uma forma de conduzir. Queremos atingir uma identidade para a arbitragem brasileira. Foi o que eu coloquei para todos. Queria resolver essa questão de notas e no critério. A análise, com imagens, vai chegar para os árbitros em até 48 horas. Vai estar registrado para ele ver. Passamos para as federações o que queremos. Se alguém não fizer durante o jogo, vai estar sabendo. Se não mudar a conduta, o tratamento em relação a esse desvio vai ser diferente. Podemos recolher a equipe, trabalhar na instrução. Esse árbitro vai perder rodadas, pode ser quem nem apite mais.

Então vai ser afastada a equipe inteira?
A equipe inteira. Todo mundo vai ter que trabalhar de forma muito unida hoje, cumprindo a regra do jogo, com critérios. Queremos algumas posições mais firmes de controle de jogo. Se mereceu o cartão com dois minutos, tem que dar. Tem que cumprir a regra. Temos que reeducar técnicos e jogadores. Temos que acabar com a malandragem, que cresceu com algumas condescendências da arbitragem. Agora está pagando o preço. Não é cruzada contra isso ou aqui. É cumprir a regra do jogo. Fácil. Não é só distribuir o cartão, a equipe tem que ser pró-ativa, chegar junto, aprimorar, estudar. Quem não fizer, vai estar sendo tirado. Vou chamar aqui, dizer no que vacilou, que não teve critério, que determinado erro poderia ser evitado. Vamos querer saber de todos por que não aconteceu. Todo mundo vai se manifestar. Vamos ter uma cobrança rápida e contínua.

Pelo visto a comissão de arbitragem vai ficar mais rigorosa…
Muito mais rigorosa. Por isso melhoramos o protocolo. Colocamos sugestões do banco de dados da Seleção Brasileira. O analista não vai escrever o que ele quer. Ele vai ter que colocar coisas que eles não viam. Estamos mudando a forma que eles analisavam a partida. Fizemos instrução com eles, tiveram curso. Dentro desse protocolo, a coisa vai evoluir para todo mundo. Vou ser obrigado a me movimentar com esses resultados.

Como integrar esse trabalho com as federações estaduais? Porque um árbitro pode atuar de um jeito nas competições nacionais e outro nos estados…
Tudo o que está sendo feito aqui vai ser passado aos presidentes das comissões estaduais. Eles vão ter um link para acompanhar o dia a dia, vão ver a evolução. No fim do ano, vai ter um relatório de cada árbitro e ter condição de trabalhar individualmente. Vai chegar um tempo que vamos estabelecer metas e determinada pessoa só continua se tiver metas. Vamos acompanhar também nos quatro primeiros meses do ano. Se ele não tiver progredindo, ele não volta para o quadro. Estou colocando à disposição deles. Vamos ter o encontro no Paraná em maio, eu vou expôr o sistema. Gostaria que as Federações adotassem. Se tivermos a mesma linguagem, fica mais fácil.

Não teme gerar uma pressão ainda maior para os árbitros?
Não tem que ter pressão. Tem que ter comprometimento com o que nós queremos. Se a equipe trabalhar direito, dentro da linha que queremos… O trabalho em conjunto tem que ser o mais perfeito possível. Eu não quero ver erro bobo. Um exemplo: o assistente dá escanteio e o árbitro da tiro de meta. Se eu vir isso, vou na veia. Não houve trabalho de vestiário, planejamento. Tem que olhar, microfone… Antes de dar uma decisão, namore.

O projeto é fazer uma “escola brasileira” de arbitragem?
Não tem escola. Tem que aplicar a regra. Contato físico de falta é igual no mundo inteiro. A interpretação que é a dificuldade.

Fonte: De Prima (UOL)