Gramados usados na base jogam contra a formação de jogadores

A foto acima é ilustrativa. O gramado do estádio Romário de Souza Faria, popularmente conhecido como Marrentão, em Xerém, Rio de Janeiro, recebeu o jogo entre Vasco e Bonsucesso pelo Campeonato Carioca Sub-20. O Vasco venceu por 3 a 0, e enfrentou, além do adversário, um gramado terrível, completamente incompatível com a prática do futebol.

Os problemas no campo eram muitos. Alguns são visíveis, como os desníveis na grama. Em alguns pontos, a bola corria solta. Em outros, era amortecida a ponto de parar. Em chutes de fora da área, se a bola quicasse, era capaz até de mudar de direção. O tal “montinho artilheiro” estava presente com vários irmãos e oferecia perigo aos goleiros. Pelo menos duas furadas foram vistas por causa do estado do campo, que foi autorizado pela Ferj a ser utilizado pelo Bonsucesso como mandante no torneio.

O Marrentão, vale muito dizer, não pode ser usado como bode expiatório. Campos como este ou mesmo em pior estado são constantemente vistos na base brasileira, de acordo com relatos de diversos profissionais de clubes grandes, médios e pequenos. Em tempos de 7 a 1, quando a moda é meter a porrada na formação e dizer que o Brasil está atrás dos países europeus, vale também comparar as condições de trabalho que cada país tem para formar seus jogadores. E nesse caso não adianta o clube investir nele próprio. É preciso, na visão do blog, que haja um esforço coletivo e sejam propostas soluções.

Ainda há, no entanto, visões opostas. E o papo de que “quem é bom, é bom em qualquer campo” ainda resiste quase como uma tática de guerrilha. Serve dar algum tipo de vantagem aos clubes pequenos, que já saem em um revés financeiro. Há também quem realmente não tenha dinheiro para investir em manutenção de gramado. Mas a situação é tão caótica que apenas um cortador de grama seria útil em muitos casos.

Campos assim impossibilitam um jogo coletivo de toque de bola, que tanto se vê lá fora. Estimulam o chutão, o choque físico, a porrada comendo solta. Colocam em risco a integridade física dos jogadores, alguns deles já com multas rescisórias milionárias, e muitas vezes não representam novos desafios na formação deles. Em tese, aumentariam a capacidade de improviso, mas contra equipes pequenas com marcadores, em tese, ruins? Difícil de acreditar.

O debate sobre esse tema é raso. Muito porque o discurso de que a base brasileira tem problemas só aparece quando a bomba estoura no profissional ou quando a seleção sub-20 vai mal. Muito também porque os clubes grandes, maiores prejudicados com essa situação, silenciam em nome de boas relações com os pequenos (muitas vezes formadores de bons jogadores também) em vez de expor o problema.

Pouco se fala também sobre o tenebroso horário das 10h em que a rodada do Carioca Sub-20 foi disputada no sábado. Horário que, diante da temperatura do dia, poderia ter causado algum mal súbito em alguém. Não causou. Foram apenas jogos para a posteridade. A esculhambação, quando dá certo, vira história. Quando não dá, vira tragédia. E até a próxima tragédia, a base seguirá sendo terra de (quase) ninguém, vista por (quase) ninguém, exercendo silenciosamente a função de bode expiatório de tudo quando a bomba estoura no profissional.